A privatização dos serviços púbicos, tão em voga em discursos e governos neoliberais, tem um agravante em seus efeitos nem sempre debatidos pela sociedade com a intensidade que o assunto merece. Além da já constatada piora na prestação dos serviços públicos, é possível verificar também uma sensível precarização das condições de trabalho daqueles que se ocupam das atividades então privatizadas.
O debate, em geral, resume-se aos aspectos econômicos e a uma eventual modernização da empresa privatizada, com uma suposta melhoria na prestação de serviços. Considerando que tais falácias neoliberais costumam ser desmentidas pela realidade, soma-se a isso que pioram sensivelmente as condições de trabalho daqueles trabalhadores que passam a realizar os serviços feitos anteriormente pelos funcionários públicos concursados e, portanto, vinculados diretamente ao Estado.
Tal condição reflete-se, obviamente, na qualidade dos serviços prestados. Como costumamos verificar, a primeira providência de uma empresa recém privatizada é a demissão, ou enxugamento, dos seus quadros funcionais. Como o norte principal da empresa privada é a obtenção de lucros, vale o quanto menor a folha (e mais enxuta em termos salariais) de pagamento.
Basta verificar que o último apagão de energia elétrica no país teve por responsáveis, conforme a imprensa, a demissão de funcionários qualificados da Eletrobrás logo após a privatização. O mesmo verifica-se nas linhas da CPTM – Companhia Paulista de Trens Metropolitanos entregues à iniciativa privada e que costumam liderar a lista de reclamações dos passageiros por suas costumeiras falhas na operação.
Um outro exemplo, desta vez em nível municipal, tem-se a entrega de parte das creches da cidade de São Paulo para entidades mantidas pela iniciativa privada, muitas vezes encobertas pela definição de parcerias ou convênios da organização de sociedade civil. Enquanto um equipamento municipal mantido pela Prefeitura conta com um quadro de profissionais devidamente concursados e avaliados em suas qualificações, praticamente não há controle sobre quem exerce as mesmas funções numa entidade privatizada.
Em todos esses casos citados aqui, temos que questões salariais costumam ser colocadas em prioridade e que, se a intenção é o lucro em detrimento da qualidade do serviço, não é exagero supor a prevalência de trabalhadores que “custam” menos ao empregador.
Daí a proliferação de serviços terceirizados, ou mesmo quarteirizados, que são submetidos a condições muito piores de trabalhadores do que aqueles abrigados no funcionalismo, geralmente mais amparados por sindicatos estabelecidos e cujos salários seguem critérios não submetidos à concorrência do mercado de trabalho.
Outro aspecto que difere o trabalhador concursado daquele submetido ao mercado de trabalho formal da iniciativa privada, que tem até em sua instabilidade uma vantagem para o empregador (é mais ou menos a lógica do “não quer, tem quem quer”), é que o primeiro tem interesse em construir uma carreira no setor público sem máculas, que vai refletir no momento de sua aposentadoria, por exemplo. Já aquele terceirizado ou mesmo quarteirizado, sem maiores vinculações com o empregador além do seu contrato de trabalho – temporário ou não -, apresenta uma relação de “distância” com o local para o qual está designado para exercer suas funções, inclusive podendo ser transferido conforme desejo ou necessidade do empregador.
Diante de tal quadro, não é um despropósito relacionar as questões de privatização de empresas com qualidade de serviços prestados, bem como com a precariedade do trabalho feito pelos trabalhadores submetidos à lógica da privatização. É, urgente, portanto que a sociedade discuta a importância do serviço público em suas várias dimensões indo além das falácias sobre suposta modernização que advém da substituição do serviço estatal e público pelo privatizado – uma das maiores falácias a qual nossa sociedade está sujeita e que pouca atenção tem merecida nos debates sobre a nova realidade do mercado de trabalho.
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